Olívia de Quintana Figueiredo Pasqualeto[1]

            O avanço da inteligência artificial tem reavivou uma discussão já travada em outros momentos de avanço tecnológico: estamos em um período de destruição dos empregos em grande escala ou as novas tecnologias trarão novas oportunidades e postos de trabalho?

Segundo Ernst, Merola e Samann (2018, p.5), as transformações ocorridas nas revoluções industriais prévias não provocaram o extermínio total dos postos de trabalho existentes. Paralelamente à extinção de muitas funções rotineiras, previsíveis e mecânicas, houve também a transformação dos processos e o surgimento de diferentes tarefas (para as quais houve a exigência de diferentes qualificações e habilidades para que pudessem ser satisfatoriamente desenvolvidas).

Houve, assim, diferentes impactos no mundo do trabalho: alguns permaneceram em suas funções anteriormente ocupadas mas com certa atualização da tecnologia, outros passaram a desenvolver tarefas completamente novas e outros foram excluídos do mercado de trabalho.

Essa multiplicidade de impactos, para Schwab (2016), também tende acontecer na quarta revolução industrial, que, em razão das novas tecnologias (inteligência artificial, internet das coisas, big data, etc.) está sendo mais rápida e profunda.

Dada a rapidez e profundidade das transformações ocasionadas pelas novas tecnologias, há uma preocupação global com o futuro do trabalho. A título ilustrativo do caráter global do tema, cita-se a Declaração do Centenário da Organização Internacional do Trabalho, que afirmou que é necessária a “adoção de uma abordagem ao futuro do trabalho centrada no ser humano” a fim de se atingir uma assegurar uma transição justa um futuro sustentável (OIT, 2019a, p.12), devendo ser explorado “todo o potencial do progresso tecnológico para garantir o bem-estar material, a realização pessoal e a dignidade de todos os seres humanos, zelando por que os seus benefícios sejam equitativamente partilhados entre todos” (OIT, 2019a, p.12) e promovendo a superação dos desajustes de competências (OIT, 2019b).

            Essa é a conjuntura que circunda a advocacia e faz emergir a advocacia 4.0, isto é, uma advocacia atenta às transformações digitais e que faz uso da tecnologia para incrementar e otimizar a prestação de serviços jurídicos.

De acordo com pesquisa realizada pelo Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da Fundação Getúlio Vargas, contudo, a maior parte dos escritórios de advocacia brasileiros “não estão preparados para uma atuação baseada em tecnologias computacionais avançadas” (CEPI, 2018, p. 11), tendo sido constatado que (i) há desigualdades significativas no uso da tecnologia; (ii) o uso mais frequente de tecnologia contempla apenas ferramentas básicas de organização e não ferramentas inteligentes que possam auxiliar na própria atividade jurídica; (iii) há espaço para a implementação de tecnologias nos escritórios (CEPI, 2018, p. 11).

A esse cenário, soma-se os efeitos da pandemia de Covid-19 no incremento tecnológico. De acordo com o relatório “Ciberseguridad: riesgos, avances y el caminho a seguir en América Latina y el Caribe”, publicado pela Organização dos Estados Americanos em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, a América Latina, em um período de três meses, experimentou uma aceleração da transformação digital que estava prevista para ocorrer em três anos, “reconfigurando profundamente a nossa vida profissional e pessoal” (OEA-BID, 2020, p. 28).

Considerando esse contexto e tendo em vista que o estado de São Paulo foi epicentro da pandemia do novo coronavírus no país, a Escola Superior da Advocacia de São Paulo propõe-se a compreender quais são as iniciativas e os desafios para a qualificação profissional identificados durante a pandemia de Covid-19 para a advocacia 4.0 no estado de São Paulo.

Este texto apresenta esse novo esforço da Escola Superior da Advocacia de São Paulo em desenvolver estudos científicos e, sobretudo, realizar pesquisas que possam servir de substrato para o avanço da advocacia no estado. Em breve e, paralelamente ao desenvolvimento da pesquisa, os resultados obtidos serão divulgados nesta página.

Referências

CEPI. O futuro das profissões jurídicas: você está preparad@? Sumário executivo da pesquisa quantitativa “Tecnologia, profissões e ensino jurídico”. 2018. Disponível em < http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/28628 > Acesso em 30 ago. 2020.

ERNST, Ekkehard; MEROLA, Rossana; SAMAAN, Daniel. The economics of artificial intelligence: implications for the future of work. ILO Future of Work Research Paper Series, n. 5. Geneva: International Labour Office, 2018. Disponível em < https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/—dgreports/ —cabinet/documents/ publication/wcms_647306.pdf > Acesso em 2 mar. 2020.

OEA-BID. Ciberseguridad: riesgos, avances y el caminho a seguir en América Latina y el Caribe. 2020. Disponível em < https://www.iadb.org/pt/noticias/bid-oea-esforco-para-melhor-ciberseguranca-nas-americas-aumenta-mas-ainda-e-insuficiente >.  Acesso em 20 ago. 2020.

OIT. Declaração do Centenário. Genebra: Conferência Internacional do Trabalho, 2019a.

OIT. Skills and jobs mismatches in low- and middle-income countries. Genebra: International Labour Office, 2019b.

SCHWAB, Klaus. The fourth industrial revolution. Geneva: World Economic Forum, 2016


[1] Doutora e Mestra em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pós-doutoranda na Universidade de São Paulo. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Advogada. Pesquisadora da Escola Superior da Advocacia de São Paulo. Professora da Universidade Paulista. Professora da Universidade São Judas Tadeu. Professora na Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. Pesquisadora sênior do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da Fundação Getúlio Vargas.


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